Recife e Olinda, frevo no pé
Caboclinhos, maracatus, frevos de rua, frevos-canção, frevos-de-blocos. Esses ritmos frenéticos movimentam multidões de foliões no Carnaval colorido de Recife e Olinda. Quem vai uma vez, não esquece jamais de Capiba e Antonio Maria, do Galo da Madrugada, das orquestras de frevo se encontrando na Pitombeira dos Quatro Cantos de Olinda. E os recifenses distantes, que voltam para terra vez ou outra, pousam no aeroporto cantando “Voltei Recife/Foi a saudade que me trouxe pelo braço/Quero ver novamente Vassouras na rua abafando/Tomar umas e outras e cair no passo”.
Divulgação No Carnaval de Pernambuco, o frevo é quem comanda a folia |
E o passo do Carnaval pernambucano é feito com uma sombrinha na mão, marca do frevo centenário e símbolo da prefeitura do Recife. No Carnaval do frevo não entram samba-enredo, escolas de samba nem trios elétricos e ritmos baianos. Em vez disso, há desfiles de blocos com nomes divertidos, como Galo da Madrugada, Segura a Coisa, Segura a Coisinha, Elefante, Pitombeira, Bloco da Saudade, Homem da Meia-Noite, Mulher do Meio-dia, Bacalhau do Batata, Urso Maluco Beleza... Foliões sobem e descem as ladeiras de Olinda pulando ao som das orquestras de frevo, param em frente à casa de Alceu Valença, prestam reverência ao compositor mais conhecido de Olinda e continuam a festa até a Quarta-feira de Cinzas. Uma das características peculiares do Carnaval recifense é a face popular: todas as grandes atrações da cidade são gratuitas. E é por isso que famílias inteiras saem às ruas, fantasiadas para brincar a folia.
Paulo Pinto/Agência Estado Desfile do Galo da Madrugada, no centro de Recife, abre o Carnaval pernambucano |
O Carnaval começa com o desfile do Galo da Madrugada, no sábado de Zé Pereira. O bloco anuncia o início da festa arrastando milhões de foliões pelas ruas do centro de Recife. Barcos ancoram no rio Capibaribe para pular com o Galo, criando blocos carnavalescos aquáticos, como o Galinha D'Água. Das janelas dos prédios comerciais e residenciais, milhares de pessoas assistem ao desfile do Galo, cantando seu hino:
"Ei pessoal, vem moçada
Carnaval começa no Galo da Madrugada (BIS)
A manhã já vem surgindo,
O sol clareia a cidade com seus raios de cristal
E o Galo da madrugada, já está na rua, saldando o Carnaval
Ei pessoal...
As donzelas estão dormindo
As cores recebendo o orvalho matinal
E o Galo da Madrugada
Já está na rua, saldando o Carnaval
Ei pessoal...
O Galo também é de briga, as esporas afiadas
E a crista é coral
E o Galo da Madrugada, já está na rua
Saldando o Carnaval
Ei pessoal..."
O desfile do Galo já entrou para o Livro dos Recordes como o maior carnaval de rua do planeta, com 1,5 milhão de pessoas. E a cada ano, a campanha para aumentar esse número é mais forte. Depois do desfile do Galo, é a vez dos blocos recifenses e olindenses pedirem passagem.
Ritmos folclóricos
Nem só de frevo vive o Carnaval pernambucano. A folia também dá espaço para manifestações culturais dos grupos étnicos, presentes em toda a região Norte do país, preenchem o calendário até o fim do feriado.
Maracatu
Batuque de ritmo compassado, que se acelera aos poucos sem nunca chegar a um andamento muito rápido. Os clarins soam anunciando o estandarte da Nação Maracatu que vai passar. A batida dos tambores é contagiante. As fantasias dos grupos, muito coloridas. E os foliões abrem passagem para o cortejo - uma das manifestações étnicas mais esperadas do Carnaval pernambucano.
Passarinho/Prefeitura de Olinda
Maracatu do Baque Virado se apresenta em Olinda
O maracatu é uma manifestação da música folclórica pernambucana
afro-brasileira. É formada por uma orquestra de percussão que acompanha
um cortejo real. Como a maioria das manifestações populares do Brasil, é
uma mistura das culturas indígena, africana e européia. Surgiu em meados do século 18. Há dois tipos de maracatu: maracatu de baque virado, ou maracatus de nação, e o maracatu de baque solto,
ou maracatu rural. Os dois se distinguem pela organização, pelo rítmo e
pelo número de integrantes. Mas ambos consistem em uma representação
das cortes negras, com reis, rainhas, príncipes, princesas e servos. Um
dos destaques visuais dos maracatus são as calungas, pequenas bonecas de
madeira escura com vestidos que representam divindades de religiões
afro-brasileiras.
A orquestra dos maracatus é formada
exclusivamente por instrumentos de percussão: tarol (tambor pequeno),
caixa de guerra (tambor maior que o tarol), gonguê (um agogô grande) e
alfaias (espécie de tambor confeccionado com madeira).
O maracatu ganhou visibilidade com a banda Nação Zumbi, do cantor e compositor Chico Science, que modernizou o ritmo misturando música eletrônica: o “mangue beat”
(referência à música “Manguetown”, maior sucesso da banda). Mas outros
compositores pernambucanos, como Lenine e Alceu Valença, mesclam
elementos do maracatu em suas músicas, popularizando a batida.
Caboclinhos
A
cultura indígena também tem sua vez no Carnaval recifense. Parte dela
se manifesta nas representações do Maracatu Rural, e parte delas nas Tribos de Índios e de Caboclinhos.
As Tribos de Índios se apresentam com roupas típicas, danças e música
com fortes elementos indígenas. O cortejo é formado por uma fila de
homens e outra de mulheres com os corpos pintados e ornamentados com
cocares e colares de penas de garça, ema ou galinha. O grupo executa de
quatro a nove coreografias embaladas ao som de duas gaitas, dois ganzás
(espécie de chocalho cilíndrico) e três surdos (tambor pequeno). Cada
tribo se identifica com um estandarte.
Já as tribos de
Caboclinhos se diferenciam pelo uso de instrumentos musicais, pelas
roupas e e pelos ornamentos. Os integrantes dos caboclinhos representam a
hierarquia indígena, como cacique, pajé, mãe-da-tribo. Os instrumentos
tocados são típicos: inúbia (um pequeno flautim de taquara), caracaxás
(reco-reco), preacas (instrumento composto de arco e flecha), tarol
(tambor pequeno) e surdo (tambor maior).
Ciganos
No Carnaval pernambucano também há ursos e bois que representam, respectivamente, os ciganos europeus e a lenda do boi-bumbá. Os blocos La Ursa e Bumba-meu-boi desfilam pelas ruas do Recife, de Olinda e das cidades vizinhas provocando os moradores com suas fantasias. O La Ursa, um homem conduz outro vestido de urso, enquanto outro integrante, que faz as vezes de tesoureiro, sai arrecadando dinheiro entre os foliões. No desfile do Bumba-meu-boi, as crianças fazem a festa. O boi sai pelas ruas dançando e fingindo chifrar os transeuntes, principalmente os pequenos. No desfile completo, o bloco representa a lenda do boi-bumbá, morto por seu dono para atender ao pedido da esposa grávida, que desejava comer a língua do animal. Na lenda, o boi é ressuscitado e tudo termina em festa.
Passarinho/Prefeitura de Olinda
Desfile do Boi-Bumbá, boi-surubim, em Olinda
Olinda
Não dá para separar o Carnaval do Recife do de Olinda. É tudo uma coisa
só,
um é extensão do outro, já que as cidades são vizinhas, separadas por
apenas alguns quilômetros. Ladeiras, blocos de rua, bonecos gigantes,
grupos folclóricos e muita, mas muita gente pulando o frevo
caracterizam o Carnaval de Olinda. É claro que há um lado ruim: a
cidade recebe mais gente do que sua infra-estrutura suporta, e é comum
ver os foliões transformando as ruas da cidade em banheiro público, já
que o número de banheiros químicos nunca é suficiente para os
visitantes. Também é comum o dia começar com dezenas de foliões
dormindo nas ruas, seja de cansaço pela maratona do dia, seja pelo
excesso de bebida consumida.
Em Olinda, o Carnaval começa com o desfile dos mamulengos, os bonecos gigantes que dançam e rodopiam ao ritmo frenético do frevo. Os bonecos chegam a ter mais de quatro metros de altura e vestem uma fantasia colorida sobre uma estrutura de alumínio. Eles são colocados sobre os ombros do condutor (a cintura fica na altura dos olhos de quem carrega), que vê o caminho por meio de uma pequena fresta na fantasia. O primeiro mamulengo foi o Homem da Meia-Noite, criado em 1932, que acabou dando origem ao bloco de mamulengos de mesmo nome, que desfila nas ladeiras da Cidade Alta. O Homem-da Meia-Noite foi carregado pelo seu criador, o bonequeiro Cidinho, por 57 anos. Cidinho não se intimidava com o calor de 40º C que costuma fazer sob a fantasia, nem com as ladeiras íngrimes da Cidade Alta. O Homem da Meia-Noite originou a Mulher do Meio-Dia, o Filho do Homem da Meia-Noite, e o Menino e a Menina da Tarde.
Passarinho/Prefeitura de Olinda
Encontro de mamulengos na Quarta-feira de Cinzas, em Olinda
Hoje, os bonecos homenageiam celebridades - ou, em tom mais divertido e crítico, gente que virou notícia no país e no Estado. Uma das maiores atrações do Carnaval olindense é o encontro dos Bonecos, que acontece no último dia da folia. Orquestras de frevo anima o desfile dos bonecos gigantes que passam por ruas superlotadas e saem de vários pontos da cidade, percorrendo roteiros diferentes. Uma das celebridades locais sempre homenageadas é o garçom Isaías Ferreira da Silva, o Batata, criador do bloco Bacalhau do Batata (o bloco foi criado com o objetivo de proporcionar um momento de folia para quem trabalhava durante o Carnaval). Quando o boneco do Batata passa pelas ruas de Olinda, os foliões já sabem que a festa está para acabar, porque logo em seguida, o Bacalhau do Batata desfila fechando o Carnaval na Quarta-feira de Cinzas
FONTE: http://pessoas.hsw.uol.com.br/carnaval5.htm